O movimento, mesmo com a duração de somente algumas horas, conseguiu espalhar medo e apreensão por parte dos fundamentos da sociedade na classe dominante.
Sabe-se hoje que ter um escravo na época não era um luxo, uma vez que a maioria dos negros se encontrava nas mãos de pequenos escravistas, que dependiam destes para a sobrevivência. Em Salvador e grandes propriedades o fato de não possuir escravos era sinônimo de pauperismo.
Acima a imagem de um nagô malê, assim denominado com as marcas do rosto, participante da revolta.
O fato de até ex-escravos possuírem escravos negros simbolizam a discriminação racial presente em todo o país. Estes trabalhadores inclusive tinham diferentes denominações: Preto, paras os oriundos da África; os Crioulos, nascidos no Brasil, valendo lembrar também os Mulatos, como o nome já indica, e, por final, os Cabras, que tinham o tom da cor que estava entre os crioulos e os mulatos.
Sendo assim, o levante malês foi significativamente preto, uma vez que em Salvador 17 325 indivíduos eram africanos e 10 175 representavam os não-africanos, crioulos e mulatos, que não participaram ativamente da revolta. A maioria numérica dos escravos “estrangeiros” é explicada a partir do “renascimento agrícola” presente na Bahia desde o fim do século XVIII até 1850, que incentivou em peso a importação de pretos, integrantes no geral das nações iorubá (nagô), jeje e hauçá. Não é de se estranhar o fato de que as revoltas eram mais freqüentes onde havia mais africanos, estes que se diferenciariam e muito dos escravos já nascidos no Brasil em termos de princípios na rebelião, tendo em vista que tais nações mencionadas já teriam presenciado a liberdade, ao contrário dos demais escravos.
Já os crioulos, descendiam de outros povos africanos como os bantos (de Angola e Congo), vindos da Costa da Mina e outros menores grupos. O diferencial no quesito resistência era, como o exemplo de tradição banto, os quilombos; tendo em vista que estes nascidos no Brasil, no geral, jamais experimentaram a liberdade no continente de origem.
Segundo João José Reis, em 1835 no levante, cerca de 70% dos presos eram nagôs. Foram identificados sete líderes: Ahuna, Pacífico Licutan, Luís Sanim, Manoel Calafate, Elesbão do Carmo, o Dandará, Nicobé e Dassalú. Apontado como principal líder, Ahuna ou Aluna conseguiu fugir e dele não se teve mais notícias. Dos outros descobriu-se que apesar de diferentes raízes, todos eram mulçumanos (malês), tinham conhecimento do Alcorão, praticavam a língua árabe e eram respeitados pelos demais africanos.
Assim, a despeito de parecer ter um caráter religioso, o Levante Malês era essencialmente caracterizado antiescravista praticado por escravos. Por razões étnicas, os chamados pretos eram hostis até com os crioulos e mulatos, estes considerados do “mundo dos brancos”, de fato eram utilizados pelos senhores de forma repressiva em relação ás rebeliões escravas. Dessa forma as atitudes dos rebeldes indicavam a idealização de uma Bahia africana, na qual os brancos e os crioulos seriam mortos, e segundo Guilhermina Rosa de Sousa – mulher de Domingos Fortunato – denunciante da revolta-, os mulatos seriam poupados e logo se tornariam escravos.
Apesar da ordem social imaginada não ser nada justa, a iniciativa antiescravista deve ser considerada. Vale lembrar que os africanos encaravam a escravidão como praxe daqueles que dominavam, uma vez que os ideais europeus de igualdade e justiça (iluminismo) não eram difundidos na África.